O TOMÁS DA BASE AÉREA DA OTA - 1972
VER AQUI UMA ANÁLISE CERTEIRA
Por esses tempos andava na Base Aérea da Ota onde toda a gente conhecia o "TOMÁS" e o "NORONHA". não importam os postos o que importa é referir o perfil.
Era óbvio que não criavam simpatias com facilidade pois eram do tipo "cria o medo para impores respeitoª", como o faziam os professores de antigamente.
Eu comandava uma coluna de alunos do curso TOCART. Tinha ali sido colocado depois de um rocambolesco episódio cujos contornos nunca consegui deslindar devidamente mas que eram fruto de um clima de opacidade e de intimidação que reinava então. A PIDE DGS tinha roda livre e quem ousasse dizer algo que era contra o "sistema" era cozinhado em lume brando e lançado às urtigas, tivesse ou não tivesse razão. O regime não tolerava "poetas" ou gente que pensava por si...
Um capitão do quadro permanente numa recruta disse aos soldados cadetes que na Guiné a situação era muito grave e os meios técnicos dos "turras" eram superiores aos nossos em certos casos. A situação estava por um fio...
Para mal dos seus pecados havia um agente da Pide infiltrado entre os alunos. Foi fazer queixa do tal capitão dizendo que estava a baixar o moral e a dramatizar. O suposto mau carácter, desmotivador e desmoralizador das tropas __ que disse simplesmente a VERDADE__ foi transferido e a Base ficou a tremer com esta actuação de um agente da Pide.
O Noronha e o Tomás eram homens de confiança do regime. Estava lá também um tal Coelho Dias e um tal José Cid, então do conjunto 1111, e também formado em educação física pelo ISEF. Lançava as suas bocarras na parada lá do alto de um palanque de madeira.
Neste contexto sou apanhado por tabela . Estou a comandar uma formatura, e um cadete, a caminho do GITE (a tal universidade da OTA, como dizia o Tomás), ia com a barba por fazer.
A carrtinha do Tomás parou, de repente, ele pediu-me para chegar junto dele. Dei ordem para todos suspenderem a marcha e lá fui, desejoso de saber o que queria Sua Majestade!
«Quem é aquele gajo ali com a barba por fazer?»
«É o Armando Faria que tem estado adoentado mas vai fazer a barba antes das aulas...»
Perante tal desculpa esfarrapada ele foi peremptório: «Logo apareça no meu gabinete!»?
Entretanto avisei o Armando para ir fazer a barba e acompanhar-me ao gabinete. Ele recusou pois disse que era eu o visado pelo referido senhor.
Enfim, aceitei e fui sozinho enfrentar a besta quadrada. Ia disposto a dar luta. Era um assunto tão mesquinho, tão mesquinho, que só de pensar nisso me revoltava. Era assim o regime e os homens poderosos de então!
Disse-me de chofre:
«Ou você ou ele, um vai ter de ser punido!»
Respondi com indignação:
«Eu já lhe tinha avisado mas achei por bem deixar que seguisse na formatura pois as aulas parecem-me mais importantes que uma simples formalidade»
«A nossa tropa é o espelho da nação. Você como líder tem de assumir a responsabilidade. Ele não cumpre porque você não é disciplinador.»
Eu era amigo do Armando Faria, de Leiria. Ele tinha um Volkswagen creme e eu um Morris Mini e convivíamos com muita frequência. Não queria prejudicá-lo. Mas disciplina é disciplina.
Falei como seu advogado de defesa e disse-lhe que em tempo de guerra as formalidades deviam ser subalternizadas, que o importante era a eficácia. e lá deixei a criatura a falar sozinha.
Disse-lhe que decidisse o que achasse melhor. eu até aceitava a punição mas não era masoquista... Deixava ao seu critério, não queria tomar uma posição como ele pretendia que o fizesse...
Enfim, o Ar,mando foi punido com uma repreensão (salvo erro). Contudo, fiquei avisado para o futuro. quem não for disciplinador leva porrada!!!Contudo, agora, à distância, reconheço que ele era fruto da época, tal como os professores e até os pais de então...A ditadura criou um pensar coletivo, uma idiossincrasia, um modus vivendi onde o medo era a mola propulsora de tudo...Medo para infundir respeito...
O culto da intimidação, do medo, da repressão era a filosofia que alimentava aquele regime odioso...TOMÁS E NORONHAS ainda existem por aí, nalgumas autarquias, nalgumas famílias, nalguns clubes de futebol que criaram claques que são o braço armado dos detentores do poder...O fascismo continua, mas mais visível a olho nu, mais às claras...
J Leite de sá
Por esses tempos andava na Base Aérea da Ota onde toda a gente conhecia o "TOMÁS" e o "NORONHA". não importam os postos o que importa é referir o perfil.
Era óbvio que não criavam simpatias com facilidade pois eram do tipo "cria o medo para impores respeitoª", como o faziam os professores de antigamente.
Eu comandava uma coluna de alunos do curso TOCART. Tinha ali sido colocado depois de um rocambolesco episódio cujos contornos nunca consegui deslindar devidamente mas que eram fruto de um clima de opacidade e de intimidação que reinava então. A PIDE DGS tinha roda livre e quem ousasse dizer algo que era contra o "sistema" era cozinhado em lume brando e lançado às urtigas, tivesse ou não tivesse razão. O regime não tolerava "poetas" ou gente que pensava por si...
Um capitão do quadro permanente numa recruta disse aos soldados cadetes que na Guiné a situação era muito grave e os meios técnicos dos "turras" eram superiores aos nossos em certos casos. A situação estava por um fio...
Para mal dos seus pecados havia um agente da Pide infiltrado entre os alunos. Foi fazer queixa do tal capitão dizendo que estava a baixar o moral e a dramatizar. O suposto mau carácter, desmotivador e desmoralizador das tropas __ que disse simplesmente a VERDADE__ foi transferido e a Base ficou a tremer com esta actuação de um agente da Pide.
O Noronha e o Tomás eram homens de confiança do regime. Estava lá também um tal Coelho Dias e um tal José Cid, então do conjunto 1111, e também formado em educação física pelo ISEF. Lançava as suas bocarras na parada lá do alto de um palanque de madeira.
Neste contexto sou apanhado por tabela . Estou a comandar uma formatura, e um cadete, a caminho do GITE (a tal universidade da OTA, como dizia o Tomás), ia com a barba por fazer.
A carrtinha do Tomás parou, de repente, ele pediu-me para chegar junto dele. Dei ordem para todos suspenderem a marcha e lá fui, desejoso de saber o que queria Sua Majestade!
«Quem é aquele gajo ali com a barba por fazer?»
«É o Armando Faria que tem estado adoentado mas vai fazer a barba antes das aulas...»
Perante tal desculpa esfarrapada ele foi peremptório: «Logo apareça no meu gabinete!»?
Entretanto avisei o Armando para ir fazer a barba e acompanhar-me ao gabinete. Ele recusou pois disse que era eu o visado pelo referido senhor.
Enfim, aceitei e fui sozinho enfrentar a besta quadrada. Ia disposto a dar luta. Era um assunto tão mesquinho, tão mesquinho, que só de pensar nisso me revoltava. Era assim o regime e os homens poderosos de então!
Disse-me de chofre:
«Ou você ou ele, um vai ter de ser punido!»
Respondi com indignação:
«Eu já lhe tinha avisado mas achei por bem deixar que seguisse na formatura pois as aulas parecem-me mais importantes que uma simples formalidade»
«A nossa tropa é o espelho da nação. Você como líder tem de assumir a responsabilidade. Ele não cumpre porque você não é disciplinador.»
Eu era amigo do Armando Faria, de Leiria. Ele tinha um Volkswagen creme e eu um Morris Mini e convivíamos com muita frequência. Não queria prejudicá-lo. Mas disciplina é disciplina.
Falei como seu advogado de defesa e disse-lhe que em tempo de guerra as formalidades deviam ser subalternizadas, que o importante era a eficácia. e lá deixei a criatura a falar sozinha.
Disse-lhe que decidisse o que achasse melhor. eu até aceitava a punição mas não era masoquista... Deixava ao seu critério, não queria tomar uma posição como ele pretendia que o fizesse...
Enfim, o Ar,mando foi punido com uma repreensão (salvo erro). Contudo, fiquei avisado para o futuro. quem não for disciplinador leva porrada!!!Contudo, agora, à distância, reconheço que ele era fruto da época, tal como os professores e até os pais de então...A ditadura criou um pensar coletivo, uma idiossincrasia, um modus vivendi onde o medo era a mola propulsora de tudo...Medo para infundir respeito...
O culto da intimidação, do medo, da repressão era a filosofia que alimentava aquele regime odioso...TOMÁS E NORONHAS ainda existem por aí, nalgumas autarquias, nalgumas famílias, nalguns clubes de futebol que criaram claques que são o braço armado dos detentores do poder...O fascismo continua, mas mais visível a olho nu, mais às claras...
J Leite de sá
Gostei do texto. Quem passou pela Ota certamente se lembra, sempre por maus motivos, dessa criatura.
ResponderEliminarLamento mas, passados todos estes anos, não consigo encolher os ombros porque "coitado, já morreu"... um sacana é um sacana... e não deixa de o ser porque "bateu a bota".
A criatura de que falamos tinha o prazer sádico de amachucar quem passava perto dele... e se não houvesse motivo, ele tratava de o inventar.
E, claro, o medo não infunde respeito... o facto de eu "ter medo de um assassino" não quer dizer que o respeite, apenas tenho medo dele.
Nunca respeitei o Tomáz e, passados todos estes anos, o sentimento não mudou.
Não posso dizer que o odeio porque, uma das coisas que a idade conseguiu "roubar-me" foi a capacidade de odiar... há muito que os meus ódios se transformaram em pena... quem suscita ódios é, geralmente, uma pessoa infeliz...
Falta apenas acrescentar que que também fui chefe de turma (ou melhor, fui sub-chefe... mas como o chefe estava sempre desenfiado, eu é que "ficava nos cornos do boi"...) e por essas duas razões (chefe que não é chefe e está a "tapar" o verdadeiro chefe...) de cada vez que "cheirava" o Tomáz à distância os "pelinhos ficavam todos em pé"... bastava ele mandar parar a formatura e pedir a pauta, para eu ficar lixado com F grande...
A única vez que me apanhou, foi à distância, estava "fora do sítio" e ele ainda gritou para mim o seu grito de guerra "OH aluno, oh aluno, olha que eu estou-te a ver! Anda cá!"
Claro que não fui coisa nenhuma... desatei a correr, meti-me no pinhal e só saí nas traseiras no 2º hangar do GITE, onde arranjei maneira de me integrar no grupo onde deveria estar quando a alimária me caçou... Só sei que o cagaço foi tão grande que não voltei a meter-me noutra... mais uma vez, não por respeito mas por MEDO!
Um abraço
Vítor Beça, 1ª de 71, Eabst