Cobardias...

COBARDIA MORAL, EXISTE...
Hoje em dia há virtudes que são exploradas de forma assaz pitoresca. "Coragem" é tantas vezes, uma forma de cobardia. Quem adopta uma postura firme mas serena, sem espaventos, por vezes alardeia uma coragem muito superior ao que vocifera e se encoleriza vomitando decibéis para impor a sua postura, tantas vezes oca e vazia de conteúdo.
Hitler e Mussolini foram exemplos de "coragem" e de fanfarronice que aterrorizaram o mundo inteiro. Contudo, praticaram (ou mandaram praticar) actos abomináveis, hediondos, de uma cobardia monstruosa. Quem detém o poder (seja ele qual for...) pode exteriorizar esse poder e intimidar, achincalhar; contudo, mais tarde ou mais cedo, esse "modus actuandi" será censurado pelo devir. A História está repleta de situações dessas, infelizmente.
Muitos de nós fomos vítimas de pequenos e médios ditadores que, à sua maneira, impuseram directrizes e violentaram princípios éticos para se imporem e até branquearem a imagem. Apeados do poder, estrebucham e tentam erguer-se à custa de cúmplices e de "compagnons de route" caídos em desgraça, contudo, sempre gratos e dispostos a tudo para restabelecer o" status quo ante", com objetivos óbvios...
Alguns, graças ao poder financeiro que certos cargos propiciam criam divisões nas famílias (procurando aliciar os mais corruptíveis para o seu "lado", visando denegrir e isolar o cidadão honesto que procura limpar os cancros e lancetar os tumores de corrupção que por aí campeiam. E há sempre caciques ou candidatos a isso que se deixam atrelar a troco de pratos de lentilhas...
Em sentido lato o ambiente é este. Concretamente, pretendo escalpelizar aqui, uma figura do meio castrense, tida por "corajosa" e "arrogante", mas que, na prática, não passava de um cobarde moral e cívico, que se baseava no cargo para exercitar os seus desmandos e bolsar a sua bílis eivada de despotismo a roçar o anedótico. Humor patológico o deste cretinóide, que cultuava o antigo regime com todas as suas forças e que se bandeou para o regime de Abril, pensando colher benesses e mordomias, por isso.
Falo do cretino que mandou para a Pide-DGS o turista francês que entrou inadvertidamente na BA7. Falo do segundo comandante, major Joaquim Manuel Matono Cóias.
Quero aqui falar de outra "cereja" em cima do bolo do seu destrambelhamento e da sua cobardia moral. Chamou-me ao seu gabinete para investigar um prisioneiro que se recusara a ir trabalhar para as oficinas. Queria saber que explicação dava para essa recusa. Eu, que nada tinha a ver com as oficinas (de material terrestre), que não conhecia o prisioneiro de lado nenhum, lá fui interrogá-lo, a mando de Sua Excelência.
A explicação que me deu era convincente. Disse que enquanto pode, foi sempre trabalhar com gosto, pois usufruia de liberdades como ir ao bar e frequentar espaços de lazer. Contudo, alegou que a doença de que padecia (iria ser operado em breve, disse com tristeza) impedia-o de trabalhar, pois sofria imenso com dores. Enfim, gostava do trabalho, apetecia-lhe, mas não podia por causa das dores.
Relatei tudo, ao referido segundo comandante. Este riu-se com ar superior e replicou: «Você é mesmo um ingénuo! então não vê que ele está a arranjar uma desculpa!?»
Repliquei em defesa do visado: «Não seria melhor perguntar aos Serviços de Saúde, ou ao médico da BA7, se será verdade o que ele está a dizer?»
Zombou e até gozou com a minha suposta "ingenuidade". Deu ordem para escrever no livro do Oficial de dia que o referido soldado estava impedido de gozar os tempos livres fora da prisão, como ir ao bar e frequentar as áreas de lazer da Base, enquanto não fosse trabalhar para as oficinas. Escrevi a ordem dada e nunca mais soube de nada pois não me competia saber. Era um assunto da estrita esfera do comandante, a partir daquele momento.
O tempo foi decorrendo. O 25 de Abril surgiu dentro de algum tempo. As mentalidades outrora repressivas e ditatoriais começaram a "moldar-se" aos novos tempos. O soldado pediu a ajuda do capelão para resolver a situação. Eu fui interpelado por este e contei toda a verdade. Admiti que o referido 2º comandante se tivesse esquecido e não se tivesse preocupado em investigar a seriedade da argumentação do preso.
Uns dias depois fui surpreendido, na messe de oficiais, na hora do almoço, ao ser interpelado publicamente pelo referido 2º comandante que negou ostensivamente ter dado aquela ordem!!!
Eu chamei-lhe mentiroso e cobarde, de caras. Mandou-me por em sentido. Disse que me punha em sentido mas que não aceitava aquele comportamento. Se tivesse feito aquilo de que me acusava era um abuso e um acto grave de indisciplina. Que me movesse um processo! Injuriar, na frente de todos os oficiais, era impróprio da instituição militar e um acto inqualificável.
Cobardemente, insinuou-se junto do novo comandante, e lá conseguiu fazerr-me a folha. Como não podia mover-me processo pois os inquiridores iriam acusá-lo a ele, de abuso de autoridade, de prepotência e injúria, conseguiu que fosse transferido de unidade!
Fui obrigado a interromper um curso que se encontrava a meio, tive prejuizos enormes, e lá fui, para Lisboa, com os seguintes dizeres na guia de marcha (que só tive oportunidade de ler, já em Lisboa): «O oficial em questão, pessoa inteligente, disciplinada e disciplinadora, toma, por vezes, certos comportamentos onde denota falta de bom senso!»
O cretinismo elevado ao máximo expoente. Que se pode dizer de um carácter destes? Via em mim um obstáculo à sua ascensão ao universo abrilista recém-aberto, e, incapaz de me derrubar, pois não tinha elementos credíveis, conseguiu "contornar" este obstáculo com astúcia e artimanha, pactuando com a inexperiência do novel comandante que havia chegado há muito pouco tempo. Conseguiu, graças a uma prática de bajulação sistemática ao novo comandante,__ que até dava para dichotes de alguns mais perspicazes,__ evitar as consequências de um processo disciplinar que podia dar para o torto e lançar borda fora um espinho na "garganta", uma incómoda "pedra no sapato"....
O tempo, esse juiz implacável, faz a Verdade vir à tona, tarde ou cedo. Contudo, o que passei por causa deste tiranete, os danos morais e até financeiros, ficaram por minha conta.
 
 
 
 
 

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